Nos últimos anos a União Europeia foi testemunha da eclosão de uma série de processos sociais e culturais que são frutos da tensão acumulada ao longo do tempo e que foram negligenciados pelo Bloco, bem como sepultados pelos discursos de integração. A radicalização da sociedade é o pior reflexo dessa negligência, gerando uma divisão da mesma e dando espaço para o surgimento de movimentos extremistas ou a adesão de vários jovens europeus a causas fundamentalistas, tais como o Estado Islâmico (EI).
Mesmo que esteja presente desde a sua fundação, a multiculturalidade da União Europeia não levou em consideração a própria formação demográfica dos países membros e os efeitos da ampliação do Bloco, assim como outros processos humanos, tais como a migração e a mobilidade internacional.
Atualmente, a região é um mosaico de culturas, povos, etnias e religiões, com fortes avanços em algumas áreas e grandes retrocessos em outras, principalmente no que tange as minorias.
Se por um lado a Alemanha aprovou o casamento LGBT, por outro, países como a França proíbem o uso de algumas das vestimentas típicas da cultura islâmica (ainda que o país possua uma considerável comunidade muçulmana). No entanto, o atrito entre culturas não afeta somente a convivência na União Europeia, mas também se reflete em setores cuja principal característica é justamente essa confluência de pessoas diferentes e o turismo é um deles. A turismofobia é crescente em cidades com um elevado fluxo de turistas. Cidades como Barcelona, cujo turismo representa mais de 15% do PIB e recebe mais de 11 milhões de turistas ao ano, consideram paradoxalmente que a atividade turística é um dos seus principais problemas. A inflação dos preços é um dos essenciais motivos para esse repúdio crescente, mas também a vinda de turistas não tradicionais como indianos, russos e até mesmo cidadãos de outros países da União, que são acusados de deteriorar o patrimônio público e afetam a rotina da cidade.
A sociedade europeia, talvez pelo fato de ser testemunha de diversos processos sociais e centro de mudanças e revoluções importantes, é uma das regiões do mundo onde se refletem as principiais questões globais, desde os benefícios do processo de globalização como também dos paradigmas mundiais. E mesmo com um discurso de construção de uma identidade europeia desde a concepção do Tratado de Roma, observa-se que, na prática, ainda existem pontos conflitivos e que alguns casos chegam a evidenciar essa multipolaridade cultural, como atualmente o fez o processo de cisão entre o Reino Unido e a União Europeia (Brexit), sendo um dos principais argumentos a situação da migração interna. A mesma situação se dá também em outros países da União que recebem migrantes de nações do Bloco.
No caso das minorias, todo avanço ou recesso é potencializado pelos holofotes da mídia e rapidamente ganha as redes sociais, porém não existe um movimento da própria União Europeia de analisar esses processos como parte integrante de uma contínua mudança pela qual ela passa e que, sem dúvidas, irá refletir na criação de uma identidade europeia.
Da mesma forma que a microeconomia reflete processos macroeconômicos e vice-versa, tal vez seja interessante tomar esse exemplo como parâmetro e analisar como as mudanças em pequenos grupos impactam em toda a sociedade, seja para aumentar a equidade e igualdade, seja para gerar maiores cisões.
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Fontes das Imagens:
Imagem 1 “Espaço Schegem” (Fonte):
https://urbanismoguerra.files.wordpress.com/2015/09/rotas_migratorias_europa.jpg
Imagem 2 “Policiais franceses obrigam mulher a tirar seu véu na praia” (Fonte):
Imagem 3 “Manifestações contra os turistas em Barcelona” (Fonte):
https://static.hosteltur.com/web/uploads_c/2016/04/B_1a8a090c67464a4cef512393faab7b42.jpg